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quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Estados Unidos, 2015: os certificados de virgindade ainda existem

Dia do casamento: a noiva, radiante, vestida de branco, chama o pai visivelmente babado e pede a atenção dos convidados. Inusitadamente, oferece-lhe um “certificado de pureza”, assinado pela sua ginecologista, como prova da sua virgindade. O certificado garante que o seu hímen permanece intacto, uma frase acompanhada depois por uma passagem da bíblia. O pai, pastor da igreja, fica radiante e posa para a foto orgulhoso da pureza da filha de 22 anos. Para que não sobrem dúvidas: sim, estamos a falar dos Estados Unidos, em 2015.

Esta história começou a fazer furor nas redes sociais quando a noiva, Brelyn Freeman, publicou a história no seu Instagram, junto a uma foto em que está a dançar com o pai na festa de casamento: “Tive a oportunidade de apresentar um certificado de pureza ao meu pai, assinado pela minha médica que garante que o meu hímen permanece intacto. Um pacto que fizemos quando eu tinha 13 anos. Quando honramos Deus, a nossa vida automaticamente honra os outros. Amo-te papá!”. A foto de pai e filha a pousarem com o certificado acabou por eventualmente ser também posta online e tornou-se viral. De repente, o certificado de virgindade de Breylin corria os jornais nacionais e, mal esta voltou de lua de mel, as televisões caíram-lhe em cima.

Breylin explicou que oferecer este certificado de pureza ao seu pai era uma forma de lhe demonstrar que quando dá a sua palavra, cumpre o prometido. Um género de voto de confiança. Mas as críticas sobre aquilo que muitos chamam de promoção de virgindade até ao casamento não pararam. Alguns elogiam a decisão, mas a larga maioria das pessoas que partilha a imagem considera-a ora “grotesca”, ora “estranha” e há quem a considere um elogio ao modelo patriarcal, algo que não faz sentido nos tempos de hoje.

A virgindade é um decisão individual, ok?

Ora bem, parece-me necessário esclarecer uma coisa: o que está aqui em causa não é se é certo ou não esperar pelo casamento para perder a virgindade. A questão é que ninguém deveria ter de sentir que precisa de provar a alguém que ainda é virgem ou não. Nem ao pai, nem à mãe, nem ao padre, nem ao noivo. Iniciar a vida sexual é uma decisão individual de cada um, dependente exclusivamente da nossa vontade e não da vontade de quem nos rodeia.

O que os pais realmente podem e devem fazer é falar abertamente sobre o tema com os seus filhos, algo que ainda pouco acontece. Explicar não só as consequências e perigos associados, mas também quão bom é ter uma vida sexual satisfatória, descomplexada e saudável a longo prazo. Tirar o rótulo da “pureza” de cima de algo como a virgindade é francamente urgente. Ser puro é, por si só, um conceito demasiado ambíguo e que gera uma pressão que tem tanto de desmedida, como de desnecessária. E não depende certamente de um hímen rompido. Algo que, aliás, pode acontecer durante outro tipo de atividade física, como todos sabemos.

Que cada um tenha a sua crença, ou a sua fé – chamemos-lhe assim – nada contra. Mais uma vez, é uma decisão individual. Agora continuarmos a ver a sexualidade como algo impuro, punível pelos deuses e que nos pode levar ao inferno, sinceramente já chega. O tempo em que as mulheres da nossa sociedade levavam a lavagem cerebral de que as relações sexuais serviam apenas procriar já vai longe (quero eu acreditar). Não vamos voltar ao mesmo. Foram séculos de repressão sexual, de submissão do desejo e de espartilhamento do acesso ao prazer. Algo que, já agora, faz mesmo muito bem à vida e que se recomenda.

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